Era noite de
quinta feira, dia 30 de Maio de 2013, quase madrugada do dia 31. Eu, na Arena Independência, não tinha a menor
noção de tempo. Em campo jogavam Atlético e Tijuana, o placar marcava 1 x 1,
resultado que classificava o Galo. A equipe mexicana, como o Atlético, usava muito bem a jogada com o
centroavante desviando chutão. Os Xolos lançaram a bola para frente, o atacante
desviou, a zaga atleticana falhou e Léo Silva, um dos heróis do título, derrubou
Riascos, o bom atacante colombiano, dentro da área. O juiz, com coragem
singular, apitou o pênalti contra a equipe da casa.
Silêncio no
Horto. Alguns iam embora. Depois de alguns segundos um torcedor à minha frente
reclama: “Puta que o pariu, pênalti aos 46 do segundo tempo”. Ali me dei conta
do tempo de jogo. Minhas mãos foram à cabeça e depois ao rosto, entre o nariz e
a boca com uma expressão que eu nunca antes tinha feito. Era terror e
apreensão. Não sei qual a medida de cada um, mas, garanto, ambos eram em uma
quantidade insuportável. Não conseguia crer que o sonho terminaria ali, não
cria que morreríamos no Horto, onde matamos tanta gente. Não podia acontecer. O
cronômetro já estava em 48:57 quando Riascos, o melhor jogador da equipe
adversária, enfim, correu para bola. Juro, o coração parou de bater por alguns
milésimos de segundos.
Não vi direito
o que aconteceu, só vi a bola indo para cima e a torcida vibrando. Em campo, os
jogadores corriam em direção ao goleiro Victor, eu, na arquibancada, tive
receio que o juiz havia mandado voltar a cobrança. Não havia. São Victor do
Horto pulou para direita, como usual, e com o santo pé esquerdo chutou a bola
para cima. Era o primeiro milagre de São Victor. Ali, louco de emoção, falei
para o meu primo, que não continha os prantos, ao meu lado: “isso é sorte de
campeão”. Realmente era. Naquela quinta feira, naquela defesa de São Victor do
Horto, que valeu como gol, o Atlético era campeão da Libertadores 2013. Sim ali
o Galo sagrava-se campeão da América, sem menor sombra de dúvidas.
Superamos o
excelente Newell’s Old Boys na semifinal, com uma grande dose de emoção. Gol de
Guilherme no apagar das luzes, tensão o jogo inteiro e uma disputa de pênaltis daquelas de tirar o fôlego de muita gente. Tanto que, só no estádio, três
tiveram que ser atendidos pelo Samu com problemas cardíacos. Lembremos que, no
primeiro jogo, o Newell’s perdeu uma chance sem goleiro, em que Rafael Marques,
reserva da zaga alvinegra, tirou duas bolas em cima da linha. Era ou não era sorte
de campeão? Me lembro que, em São Paulo, assistindo a derrota do Galo para o tricolor paulista na primeira fase, na casa de um amigo do meu pai, entre são paulinos e corintianos, eu disse: para
tirar o Galo, tem que ganhar fora de casa de, ao menos, 3 X 0. Estava certo. Em todas as fases, esse realmente foi o limite.
Era a vez do
tricampeão Olimpia. Fomos ao Paraguai e o Olimpia perdeu um gol literalmente
sem goleiro. Reafirmei, era sorte de campeão. Ainda assim, ao apagar das luzes, os paraguaios fizeram o segundo gol, sacramentando o 2 X 0. Fosse a decisão no
Horto, afirmaria com certeza mais que absoluta que éramos campeões. Mas,
daquela vez, não era. Tinha fé, fato, mas não com a mesma certeza que tive nas
fases anteriores. Me apegava, sempre que a fé era abalada, naquela defesa do
Victor, entre o dia 30 e 31 de Maio. Entretanto vi o Olimpia jogar a semifinal.
O sufoco que os paraguaios passaram, as bolas nas traves do Santa Fé, era muita sorte... Eram
dois times com muita sorte, embora o Galo fosse tecnicamente muito melhor.
O dia 24 de Julho
de 2013 não passava. Ingressos na mão, ansiedade que nunca tive antes na vida.
Os segundos pareciam horas e não conseguia fazer nada, a cabeça só tinha lugar
para a final. Às 19 horas quando, enfim, fui ao Mineirão, consegui ficar mais
calmo. O clima de final, a confiança, todo aquele ar do Mineirão me acalmava.
Bola rolando, primeiro tempo terminado em 0 x 0. A tensão aumentava a cada
segundo. No primeiro minuto, porém, para nosso alívio, Jô marcou o primeiro gol
do Galo. A partir de então um bombardeio atleticano, mas bola teimava e não entrar, mais tensão.
Defesas impossíveis do bom goleiro Silva, um gol incrível perdido por Tardelli,
embora o jogo já estivesse parado. Será que era o Olímpia estava com a sorte de
campeão? Não. A defesa de Victor contra o Tijuana jamais poderia ser em vão.
Não tenho
ideia qual minuto era, mas o Olimpia partiu em um contra-ataque extremamente
perigoso. São Victor do Horto sai desesperado para tomar a bola do atacante
olimpista, enquanto Réver o acompanhava pelo lado para fazer a cobertura.
Ferreyra passou por Victor, o coração veio à boca, era o gol do título do
Olimpia. Sem habilidade e sem esquerda, com Réver chegando de primeira para
decidir a jogada (não havia outra coisa a fazer), o atacante da equipe
paraguaia fez o certo: cortou à direita, para que ficasse inteiro na bola com o
pé bom e ainda deixar o capitão atleticano no chão. Mas, na hora em que ele
travou a bola, ele escorregou. Ali, meus caros, foi um carrinho divino,
celestial. Victor já havia garantido o título contra o Tijuana, naquele momento
era muita injustiça conosco.
Eis que os pés
do Além entraram em campo e deram um carrinho em Ferreyra, por mais cético que
eu seja, não há como pensar diferente. Tenho certeza que ali, naquele momento,
Elias Kalil, Telê Santana, Roberto Drummond, Mario de Castro e tantos outros
atleticanos ilustres ou anônimos, que não puderam ver em vida aquele momento de
glória atleticana, não quiseram ficar de fora da festa. Não mereciam ficar de
fora. Ali, seja lá de onde for, ele decidiram que Ferreyra não mudaria o
destino, destino selado naquela defesa nas quartas de final. Ali a sorte de
campeão já havia sido testada, naquele segundo, em que nem havíamos marcado o
segundo gol ainda, os pés do Além resolveram: seríamos campeões. E fomos. No céu e na Terra o Galo cantou e o atleticano vibrou.